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quarta-feira, 30 de março de 2011

ONGs nacionais e do Sul da Bahia defendem alternativas para o Complexo Porto Sul

O mundo está mudando cada vez com mais rapidez e profundidade. Questões relacionadas á qualidade de vida e ao uso inteligente de recursos, quaisquer que sejam eles, ganham mais peso nas discussões de presente e de futuro neste século. Esses são fatores que motivaram diversas organizações não governamentais, a se reunirem para pedir uma discussão séria e ampla sobre um dos projetos mais emblemáticos do embate entre os planos de infraestruura do país com o meio ambiente: a construção do Complexo Intermodal Porto Sul, no Sul da Bahia, e suas possíveis alternativas.

Imagine uma ferrovia ligando Caetité, no sudoeste baiano, ao município de Ilhéus, construída com recursos do Governo Federal e voltada basicamente para viabilizar o transporte de minério de ferro extraído por uma só empresa, a Bahia Mineração (BAMIN) que é controlada pela Eurasian Natural Resources Corporation (ENRC), do Cazaquistão. Imagine um complexo minero-siderúrgico, cerca de 20 km ao norte da cidade de Ilhéus, erguido sobre Mata Atlântica e mangues. Imagine um porto off shore com um quebra-mar sobre barreira de corais. É isto que está sendo cogitado para o sul da Bahia, mais precisamente entre as cidades de Ilhéus e Itacaré, e para um empreendimento de perspectiva econômica curta, estimada em 15 anos de acordo com o RIMA (Relatório de Impacto sobre Meio Ambiente) apresentado pela própria mineradora.

O projeto do referido Complexo Intermodal Porto Sul inclui a implantação de um porto público, de um terminal portuário privado, da Ferrovia da Integração Oeste-Leste (FIOL), de um aeroporto e uma base siderúrgica na região cacaueira e turística do município de Ilhéus. De acordo com a Secretaria de Planejamento da Bahia (SEPLAN), a FIOL será construída por consórcios privados contratados pela estatal Valec, pagos com recursos públicos na ordem de R$ 6 bilhões.

Uma Coalizão formada por ONGs nacionais como SOS Mata Atlântica, WWF, Greenpeace, Instituto Socioambiental (ISA), Conservação Internacional do Brasil, Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPE), Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, entre outras, junto com a Rede Sul da Bahia Justo e Sustentável, que conta com a participação de ONGs baianas - Ação Ilhéus, Instituto de Estudos Socioambientais do Sul da Bahia, Grupo de Ambientalistas da Bahia (GAMBÁ) e Instituto Floresta Viva - quer mostrar que existem alternativas econômicas a serem reforçadas no Sul da Bahia pela busca do pleno desenvolvimento sustentável em toda essa região, equilibrando os aspectos econômicos, sociais e ambientais. A atividade econômica regional, que se apóia na Mata Atlântica e em modelos interconectados a ela, está baseada em duas de suas principais vocações naturais, a turística e a cacaueira, as quais incluem os negócios focados no turismo ecológico e de aventura e a produção de chocolate baseada no conceito de eco desenvolvimento.

Além disso, pode-se expandir o setor da pesca; que emprega hoje diretamente cerca de nove mil pessoas no município de Ilhéus, ampliar os projetos de silvicultura e o desenvolvimento industrial do pólo de tecnologia, já em operação na região. Essas atividades são capazes de gerar empregos que atendem a demanda da região, oferecendo um salto de renda para a população local. Já a instalação das Zona de Processamento de Exportação (ZPE) é uma forma de atrair investimentos que respeitem a cadeia produtiva regional e gerem alternativas de emprego e renda para o Sul da Bahia.  A ZPE é formada por distritos industriais incentivados, e as empresas que ali decidirem se instalar contarão com o benefício da suspensão de impostos e liberdade cambial, além de procedimentos administrativos simplificados. Da sua produção total, 80%, obrigatoriamente terá como destino o mercado externo, e os 20% devem ser comercializados no mercado doméstico, pagando-se neste caso integralmente os impostos que são cobrados nas importações.

Para que o processo econômico se desenvolva plenamente no Sul da Bahia, atendendo também essa nova demanda por infraestrutura, a coalizão e a Rede Sul defendem o uso de uma logística de ferrovias e portos públicos já existentes no estado baiano para a implantação do Complexo Porto Sul, mais ao norte na região de Aratu, que minimizem os impactos à biodiversidade local e que não ofereça risco às atividades econômicas já em andamento. A alternativa, além de gerar menores impactos ambientais, reduzirá substantivamente o tempo e os recursos financeiros necessários ao aproveitar a infraestrutura logística já instalada naquela região.

De acordo com um estudo de avaliação do Porto Sul feito em 2009 pela Fundação Vanzolini, o uso dessas ferrovias e portos públicos já existentes pode reduzir o custo da obra em cerca de 60%, permitindo uma alocação mais eficiente e imediata de recursos para a população local. Tanto é relevante manter as vocações naturais da região, que foram feitos investimentos importantes nos últimos anos, inclusive pelo BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) por meio do PRODETUR (Programa de Desenvolvimento do Turismo), focado na indústria do turismo e para o plantio / beneficiamento do cacau. 

“Queremos que o Sul da Bahia se desenvolva ainda mais, só que não da forma proposta pelo governo e pela BAMIN. Não às custas de incalculável devastação ambiental, degradação das áreas de preservação permanente, favelização das cidades e oferecendo risco às atividades econômicas existentes . E ainda utilizando R$ 6 bilhões de recursos do povo para a construção de uma ferrovia que vai atender a demanda de uma só empresa por um período curto, de apenas 15 anos”, diz Renato Cunha, do Grupo de Ambientalistas da Bahia (GAMBÁ).

Parecer técnico do IBAMA é contrário a Licença Prévia
Após análises sobre a viabilidade ambiental do Terminal Portuário da Ponta da Tulha, técnicos do IBAMA emitiram parecer contrário à concessão da Licença Prévia para o empreendimento no local proposto, e sugerem que a área de Floresta Atlântica sob foco, por sua relevância ambiental, seja transformada em unidade de conservação.

Ainda segundo esse Parecer Técnico, “a instalação do Terminal no local proposto acarretará na supressão de 70 hectares de Mata Atlântica em estado médio e avançado de regeneração; a área possui grande importância biológica, com muitas espécies ameaçadas, e inclusive habitats sensíveis, como estuários, manguezais e recifes”. Além disso, os impactos para a fauna foram considerados muito significativos e os impactos sobre os recifes não são mitigáveis. Segundo esses especialistas, a instalação do Terminal Portuário da Ponta do Tulha não teve seus impactos adequadamente avaliados. Como conclusão, o IBAMA solicita à BAMIN que apresente novas alternativas locacionais para que a licença possa ser rediscutida.

Impactos socioambientais
O Complexo Porto Sul exigirá a construção de um quebra-mar de 1,5 km de extensão por 366 m de largura na base e 27m de altura e uma esteira de 2,3 km, a 10 metros de altura, cortando a costa para transportar o minério de ferro do retroporto até o ponto de chegada dos navios. Todo o processo destruiria a vasta variedade de corais e vida marinha presentes nesta região, por conta também do afundamento médio de cerca de 5 metros do fundo do oceano. Além disso, um total de 2.400 hectares de Mata Atlântica e mangues a apenas 16 km do centro de Ilhéus, na região da Ponta da Tulha, serão devastados para receber um porto de escoamento do minério de ferro proveniente da BAMIN.

A construção do Complexo Intermodal Porto Sul devastará parte do conjunto de florestas do Sul da Bahia que compõe 80% da Mata Atlântica remanescente no nordeste brasileiro, oferece risco às espécies ameaçadas de extinção (fauna e flora) e a ponte que liga o porto à terra danificará o leito de corais que jaz à linha da costa. O quebra-mar projetado para o empreendimento formará uma zona de sombra que, em longo prazo, vai modificar a conformação das praias, induzir a formação de bancos de areia, alterar a circulação das correntes e contribuir para o fechamento da barra do rio do Mangue. Já o rebaixamento do lençol freático para drenar a região em que será implantado o retro porto é uma ameaça crítica à bacia do rio Almada.

Faltam estudos que avaliem o impacto que a operação ferroviária causará à Mata Atlântica. Até o momento, os problemas ligados à infraestrutura da FIOL (pátio de trens, sistema de recepção de vagões e de descarga dos vagões) e à dispersão de pó de minério transportado em vagões abertos não foram adequadamente analisados, nem nos estudos ambientais, conduzidos pela Valec, nem nos do Porto. “Há fundadas razões para se acreditar que os impactos ambientais já identificados até agora, que decorrerão da instalação do Porto Sul e de seu cordão de indústrias, não poderão ser mitigados ou compensados. Tais impactos vão desde a destruição de trechos de mata até a dispersão de pó de minério na atmosfera”, comenta Rui Rocha, do Instituto Floresta Viva.

O Porto de Aratu é uma boa solução
O projeto de uma ferrovia para transportar produtos do oeste baiano, do Tocantins e do norte de Minas Gerais é muito mais antigo que a FIOL; a ideia original era fazer a conexão com a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) e o Porto de Aratu, como previsto no Programa Estadual de Logística e Transporte da Bahia (PELT), criado em 2004. A referida região portuária oferece múltipla competência — carga geral, grãos, química e automóveis. A construção de um novo terminal de minério na baía de Aratu ou ao longo do canal de Cotegipe acrescenta uma especialização nova e valorizaria sua vocação logística e industrial. 

A revitalização, também prevista pelo plano estratégico baiano, exigiria recursos da ordem de R$ 3 bilhões, ainda assim muito menores do que o necessário para o novo traçado da BAMIN até Ilhéus. Para atender às necessidades da mineradora, o traçado pensado até então para a ferrovia foi trazido mais para sul, tornando-se significativamente maior e mais caro. A BAMIN que originalmente previa construir um mineroduto da mina de Caetité ao terminal, tinha pré-selecionado outras áreas para implantá-lo, mas alterou seus planos diante da oferta governamental, de forma a tornar-se o cliente-âncora capaz de viabilizar toda a ferrovia.

O estudo de 2009 da Fundação Vanzolini mostrou como a escolha da Ponta da Tulha para a instalação do complexo Porto Sul foi fortemente condicionada pela redefinição do traçado da ferrovia empreendida pelo atual governo baiano e pela estatal Valec. Isso significa dizer que outros locais da região, provavelmente com menor impacto ambiental e social, foram descartados tendo em vista a impossibilidade de se construir um acesso ferroviário.

O novo traçado favorece a Bamin e, ao mesmo tempo, condena a revitalização da FCA. Ele evidencia que o governo federal abriu mão de obter carga de retorno para os trens, condição crítica para maximizar a rentabilidade da ferrovia e vale dizer, do investimento público. A conexão com a FCA e o ambiente portuário na baía de Aratu, o porto público e o terminal de Cotegipe, foram deixados de lado e a ferrovia Oeste-Leste passou a responder basicamente aos interesses estratégicos da Bamin. A ferrovia tornou-se a rota de acesso ao terminal de uso privado do empreendimento o que, por sua vez, condicionou fortemente a escolha da Ponta da Tulha e a área plana da bacia do rio Almada, em plena Área de Proteção Ambiental (APA) da Lagoa Encantada, para a instalação do porto e do retroporto.



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